Repartição de Royalties de Petróleo

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Fonte: AMORIM. Petróleo.... Ecossocialismo ou Barbárie. 28 fev. 2013. Disponível em:<http://goo.gl/LqD10Q >. Acesso em: 20 maio. 2014. 


Repartição de Royalties de Petróleo

Karina Gomes Cherubini

O petróleo é um combustível fóssil, não renovável, originado da decomposição, durante milhões de anos, de animais, plantas e outras matérias orgânicas “soterrados pelos movimentos da crosta terrestre sob a pressão das camadas de rochas e pela ação do calor” (O QUE É...,2014). Segundo a Lei nº 9.478/97 (BRASIL, 1997), é todo e qualquer hidrocarboneto líquido em seu estado natural, a exemplo do óleo cru e condensado.

Localiza-se em terrenos sedimentares, formados por camadas ou lençóis porosos de areia, arenitos ou calcários. O petróleo, depois de formado, “passa através dos poros das rochas, até encontrar outra rocha que o aprisione, formando a jazida” (O QUE É...,2014).

No Brasil, foi comemorada a sua descoberta em área denominada pré-sal, que implica pesquisas a profundidades consideráveis. A exploração de petróleo nessas áreas é regulada pela Lei nº 12.351/2010 (BRASIL, 2010), que define área do pré-sal como sendo a região do subsolo formada por um prisma vertical de profundidade indeterminada, com superfície poligonal e outras regiões que venham a ser delimitadas em ato do Poder Executivo, de acordo com a evolução do conhecimento geológico. O petróleo é a principal fonte primária para produção de energia mecânica, térmica ou elétrica (CHRISTMANN, 2014, p. 2)

Nem todo o Município ou Estado brasileiro conta com reservas petrolíferas em seu território. A produção do petróleo e de gás natural garantia o pagamento de compensação financeira aos municípios afetados, seja no transporte do óleo bruto extraído, seja na utilização de portos para escoamento ou porque as reservas ficavam em sua extensão territorial. Não só a eles. Também aos Estados correspondentes (ou ao Distrito Federal) e a órgãos da administração direta da União, como Marinha, Ministérios de Minas e Energias, do Meio Ambiente e de Ciências e Tecnologias (CHRISTMANN, 2014, p. 19).

Assim, os Municípios possuidores das reservas petrolíferas (produtores) ou que serviam para fins de embarque e desembarque da produção, tinham forte reforço orçamentário, a partir dos royalties, distribuídos a partir de um critério geográfico, decorrente da “proximidade dessas localidades em relação ao lugar onde são desenvolvidas as atividades petrolíferas” (PINTO, CORONEL, 2013).

Tais compensações, pagas pelas concessionárias do campo de petróleo (PINTO, CORONEL, 2013), visavam a eventuais adversidades surgidas para os entes federados envolvidos, inclusive ambientais (CHRISTMANN, 2014, p. 19), como, por exemplo, pela possibilidade de derramamento do óleo no momento do transporte, ou mesmo para amenizar o impacto depressivo sobre suas economias quando ocorresse o fim da exploração do recurso não renovável (SERRA, apud PINTO, CORONEL, 2013); foram denominadas royalties, a partir da palavra inglesa royalty, que significava pagamento ao rei pela extração de minerais (PINTO, CORONEL, 2013).

A previsão legal encontra-se no artigo 20, §1º, da Constituição Federal (BRASIL, 1988), que assim dispõe:

§ 1º - É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração.

Também tem previsão nas Leis Federais nº 7.990/89 (BRASIL, 1989) e 8.001/90 (BRASIL, 1990). Além dos royalties, há outras três formas de “renda mineral estabelecida pelo poder público para os interessados em explorar o potencial energético do Brasil” (PINTO, CORONEL, 2013), previstas no artigo 45 da Lei nº 9.478/97 (BRASIL, 1997). Igualmente nos termos dessa lei, o pagamento de royalties é obrigatório e mensal, a partir da produção comercial do campo licitado, embora, na prática, seja feita com defasagem de dois meses entre extração e distribuição dos recursos (LEI..., 2013).

Como tal compensação financeira não estava atrelada a finalidade específica, contando apenas com algumas vedações de aplicação, como pagamento de dívida e quadro permanente de pessoal (Lei nº 7.990/89, art. 8º), no mais cabia ao beneficiário o planejamento e a aplicação dos royalties. Em alguns casos, houve um melhoramento da situação econômica do ente federado; em outros, apesar do favorecimento orçamentário, o ingresso de recursos econômicos não retornava à população em forma de obras públicas, educação ou saúde, enfim, em melhores condições de vida.

Se a posse e a exploração de grandes reservas de petróleo não garantem por si sós a melhoria dos indicadores de um país (MARTINS; SOGARI; RUDNICKI apud CHRISTIMANN, 2014, p. 2), quanto mais de um município, que nem sempre tem, comparativamente à União, adequada capacidade técnica e gerencial. Como sustentam MARTINS, SOGARI e RUDNICKI, citados por CHRISTMANN ( 2014, p. 19), “os municípios mais dependentes da rendas petrolíferas foram também os que menos conseguiram reverter resultados desfavoráveis em termos de indicadores socioeconômicos”.

Nesse contexto, persistem debates e celeumas quanto à modificação da legislação sobre Política Energética Nacional, para modificar a forma de repartição dos royalties do petróleo, deixando de repassá-la somente aos entes federativos de alguma forma vinculados às reservas. Tanto que houve o aforamento de ações diretas de inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro (ADI nº 4917, Mesa Diretora do Poder Legislativo do Rio de Janeiro (ADI nº 4.918), pelo Governador do Espírito Santo (ADI nº 4.916), e pelo Governador de São Paulo (ADI nº 4.920) (OLIVEIRA, 2014).
Como previsto no artigo 49 da Lei nº 12.351/2010, os royalties que caberiam à União (devido à lavra ocorrer na plataforma continental, no mar territorial ou na zona econômica exclusiva), deduzidos aqueles destinados aos seus órgãos específicos, bem como os royalties das áreas do pré-sal contratadas sob o regime de concessão, destinados à administração direta da União, passarão a compor um Fundo Social voltado ao desenvolvimento social e regional, com destinação para as áreas de saúde e educação, entre outras.

As justificativas foram de que o petróleo era do país (“O petróleo é nosso”) e que havia necessidade de maior democratização no processo de distribuição de rendas (PINTO, CORONEL, 2013), com correção da concentração da riqueza entre municípios e estados na área de influência de exploração e produção. Com isto, entendeu-se pela repartição das compensações financeiras entre todos os municípios e estados, para aplicação em saúde e educação e outras finalidades legais.

Se a repartição evita desigualdades entre os Municípios, combatendo o “determinismo físico”(SERRA; MOTHÉ; MORETT, apud PINTO, CORONEL, 2013) de sua distribuição, de certa forma, olvida o caráter indenizatório da compensação (HARADA, 2014).

É verdade que são objetivos da República Federativa do Brasil a erradicação da pobreza e a redução da desigualdade social e regional. Entretanto, não será somente a repartição dos royalties – a “galinha dos ovos de ouro”, como bem colocado na charge, que permitirá alcançar tais objetivos.

Importa rever a existência de municípios sem condições de independência administrativa e financeira, aprovados em sua criação, incorporação, fusão ou desmembramento sem críveis Estudos de Viabilidade Municipal, tanto que passam a depender exclusivamente de repasses federais.

Importa rever a aplicação das verbas públicas, pois sejam provenientes da distribuição de royalties ou de impostos, em forma de Fundo de Manutenção e Desenvolvimento de Educação Básica e outros programas federais, como o Programa Nacional de Alimentação Escolar, o seu desvio é que impede a redução da pobreza e da desigualdade social.

E também rever os programas assistenciais, sem prazo de validade, que não estimulam atividades econômicas por parte dos beneficiados, podendo ter relação direta com a nova geração, conhecida como “nem-nem” (nem estuda nem trabalha).

A distribuição dos royalties a quem não tem qualquer participação ou pertencimento à reserva petrolífera, portanto, que está “fora da lógica da atividade petrolífera e de seus consequentes impactos” (PINTO, CORONEL, 2013), de certa forma, poderá ser um programa assistencialista aos entes federativos, que nem produzem riquezas, nem tem como sustentar-se. E o mais grave de tudo, pouco provável que venham a efetuar estudos e pesquisas em busca da substituição dos combustíveis não renováveis, considerando o custo decorrente do desgaste dos bens ambientais (CHRISTMANN, 2014, p. 17).

Referências:

BRASIL, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Diário Oficial da União, 05 Out 1988, p. 1 (anexo).

BRASIL, Lei 7.990, de 28 Dez 1989. Institui, para os Estados, Distrito Federal e Municípios, compensação financeira pelo resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica, de recursos minerais em seus respectivos territórios, plataformas continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, e dá outras providências. (Art. 21, XIX da CF). D.O.F.C. de 29 Dez 1989, P. 24782.

BRASIL, Lei nº 8.001, de 13 Mar 1990. Define os percentuais da distribuição da compensação financeira de que trata a Lei nº 7.990, de 28 de dezembro de 1989, e dá outras providências. Diário Oficial de14 Mar 1990, P. 5166.

BRASIL, Lei nº 9.478, de 06 Ago 1997. Dispõe Sobre a Política Nacional, as Atividades Relativas ao Monópolio do Petróleo, institui o Conselho Nacional de Política Energética e a Agência Nacional do Petróleo (ANP) e dá outras providências. Diário Oficial da União, de 07 Ago 1997, P. 16925

BRASIL, lei nº 12.351, de 22 dez 2010. Dispõe sobre a exploração e a produção de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos, sob o regime de partilha de produção, em áreas do pré-sal e em áreas estratégicas; cria o Fundo Social - FS e dispõe sobre sua estrutura e fontes de recursos; altera dispositivos da Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997; e dá outras providências. Diário Oficial da União, 23 Dez 2010.

CHRISTMANN, Luiza Landerdahl. Fontes de energia e sua regulamentação. Temas atuais de Direito Ambiental. Palhoça: UnisulVirtual, 2014.

CHRISTMANN, Luiza Landerdahl. Sustentabilidade e matrizes energéticas no Brasil. Palhoça: UnisulVirtual, 2014.

HARADA, Kiyoshi. Royalties do pré-sal. Revista Âmbito Jurídico, Rio Grande, s/d. Disponível em< http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10959&revista_caderno=26>. Acesso em 04 Ago 2014.

LEI dos royalties é publicada no “Diário Oficial da União”. G1 Política, 15 Mar 2013. Disponível em < http://g1.globo.com/politica/noticia/2013/03/lei-dos-royalties-e-publicada-no-diario-oficial-da-uniao.html>. Acesso em 04 Ago 2014.

OLIVEIRA, Samuel Cunha de. A distribuição dos royalties do petróleo entre os entes federados. Uma análise da Lei nº 12.734/2012. Jus Navigandi, Teresina, ano 19, n. 3958, 3 maio 2014. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/27646>. Acesso em: 3 Ago. 2014.

O QUE é petróleo? Unicamp- Departamento de Engenharia de Petróleo. Disponível em http://www.dep.fem.unicamp.br/drupal/?q=node/27. Acesso em 04 Ago 2014.

PINTO, Nelson Guilherme Machado. CORONEL, Daniel Arruda "Se o petróleo é nosso, porque os Royalties petrolíferos beneficiam apenas alguns municípios?". In: Observatorio de la Economía Latinoamericana, Número 179, 2013. Disponível em< http://www.eumed.net/cursecon/ecolat/br/13/royalties-petroleo-brasil.hmtl>. Acesso em 04 Ago 2014.

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